No Multiplicidade 2022, tudo deu certo dentro do impossível

Na abertura do Festival Multiplicidade 2022, a previsão era de fortes chuvas. Mas não choveu. No encerramento do Festival Multiplicidade 2022, a previsão era de fortes chuvas. Mas não choveu. Seguimos com mais notícias sobre o tempo.

Em 2018, nosso tema foi RESISTIR, EXISTIR em busca de SAÍDAS. Em 2019, foi BRASIS e nos comunicamos sempre de cabeça para baixo. Estávamos enxergando o improvável chegando perto de nós. Em 2020/21, apostamos no O QUE EU QUERO AINDA NÃO TEM NOME. Percebemos que estávamos fechando uma trilogia sobre o Brasil, mas vivemos o impensável, o absurdo, a utopia e distopia juntas para neste ano de 2022 encarar TUDO DENTRO DO IMPOSSÍVEL.

Nesse momento de recomeço, quando a pandemia começa a arrefecer, num esforço colossal para reconectar a poesia em nossas vidas, apostamos numa abertura artisticamente espiritual no Dia de Iemanjá, em que saudamos também a memória de Roberto Guimarães, Gerente de Cultura do Oi Futuro, que nos deixou em 2021.

A celebração à Rainha das Águas foi seguida por uma exposição generativa, “Bloom”, na qual um jardim digital reagia ao toque das pessoas. Justamente aquilo que foi tão caro ao longo da pandemia que parou o planeta foi o que motivou as pessoas a interagirem com os sons e as imagens do artista francês Maotik, uma “parede mágica”, como disse uma das muitas crianças que também se divertiram com a obra.

Seguimos por dois meses e fechamos a temporada com atrações remotas e presenciais na casa onde nascemos, o Oi Futuro. Ao longo desse período, mais de 3000 pessoas contemplaram a arte nos mais diversos formatos: performances, exposição, debates, filmes, residências artísticas etc.

Tivemos a parceria com o Amplify D.A.I – uma iniciativa do British Council, que joga luz no trabalho de artistas mulheres, trans, não binárias – que rendeu dois brilhantes trabalhos audiovisuais. “War” e “Amorphous materials” , frutos das residências das duplas Heather Lander (UK) e Erica Alves (BR), e Robin Buckley (UK). e VJ Grazzi (BR), respectivamente, foram exibidos num telão no Oi Futuro Flamengo, junto com as obras resultantes das parcerias do Amplify com os festivais Novas Frequências e Amazonia Mapping, e também com uma apresentação da DJ e produtora Obuxum, do Canadá. O dia contou também com um instigante debate sobre o papel feminino (e trans, não binário etc) na reconstrução de um mundo pós-pandêmico, com mediação de Maria Fortuna e falas potentes de Nayse Lopez, Marcele Oliveira e Glau Tavares. DJ e produtora, Glau completou a programação com um impecável set de balanços urbanos.

Desaceleramos um pouco com a exibição da obra audiovisual “Unite”, do músico dinamarquês Rumpistol, acompanhado do seu quarteto e do artista visual Marius Nielsen. Com sua sonoridade pastoral e seus hipnóticos visuais, “Unite” é um trabalho que reflete sobre a condição humana e foi concebido após o artista ter sofrido um esgotamento físico e emocional em 2018.

Já o filme “Nine Earths”, do britânico Mike Faulkner, exibido no encerramento do festival, levantou cruciais questões de sustentabilidade, ampliados por importantes depoimentos do climatologista Carlos Nobre e do líder indígena e ambientalista Ailton Krenak, gravados especialmente para o Festival Multiplicidade 2022.

Como bem disse a artista Bianca Ramoneda em seu poema “(des)trava língua”, feito especialmente para o festival, um impossível entoado várias vezes em sequência se transforma em um possível. E é essa mensagem que reverbera, a partir de agora, dentro de nossa resistência poética: sim, é possível.

Voltando às notícias sobre o tempo, segundo uma acertada previsão do poeta Manoel de Barros, estampada em nossa parede, “ontem choveu no futuro”.

Texto: Batman Zavareze e Carlos Albuquerque

Fotos: Coletivo Clap