A fenda espaço-tempo aberta por ‘Chronostasis’

Chronostasis

Por Carlos Albuquerque
Fotos: Bleia Campos

No fim da tarde de sexta-feira, o movimento era frenético na Fundição Progresso por conta do ColaborAmérica, festival de novas economias da América Latina. Humanos subiam e desciam as escadas do local, entravam e saíam de salas de debate, conversavam e debatiam nos corredores em torno da área de alimentação, onde copos descartáveis eram condenados e o indefectível hamburguer artesanal – ícone gastronômico da cultura empreendedora – marcava presença. Num canto, perto de onde se apresentava a DJ Érica Alves, com seu grooves orgânicos, uma porta, entreaberta por cima de uma faixa onde estava escrito “Multiplicidade”, parecia destoar de tudo, dando entrada para uma sala, cercada por panos, completamente escura. Era como uma fenda para um outro universo, bem diferente daquele exterior, onde sons e imagens inusitados estavam prestes a se instalar.

De fato, pouco depois das 19h, essa sensação foi transformada em realidade – uma estranha realidade – com o início da performance “Chronostasis”, da dupla francesa Franck Vigroux, músico que passeia do metal às texturas eletrônicas, e Antoine Schmitt, artista especializado em instalações. Parceiros desde o começo da década, os dois vêm desenvolvendo um trabalho no qual suas especialidades se misturam num enigmático novelo audiovisual. “Chronostasis” – que pega o nome de um fenômeno neurológico, no qual o tempo parece pausar por alguns segundos – é o mais recente fruto dessa combinação e sobreposição de talentos.

Chronostasis 3

Por cerca de 40 minutos – talvez mais, talvez menos – Vigroux e Schmitt criaram um ambiente de profunda abstração, um buraco negro que parecia prestes a sugar todos os presentes, inclusive eles dois. Em torno da dupla, uma estrutura circular, em forma de planeta, com incontáveis satélites retangulares, girava sem parar, ora alongando, ora contraindo suas dimensões, enquanto uma sequência de sons e ruídos, que variavam de contemplativos a perturbadores, ricocheteava pelas paredes daquela caixa preta.

Então, de repente, tudo parou, restando apenas o som ambiente – a música para os ouvidos de John Cage. Os aplausos vieram, mas não a chegada das luzes. Só quando as portas foram abertas é que o mundo exterior, real (?), voltou a ser dominante. Nele, humanos seguiam movimentando-se pelo ambiente da Fundição, conversando, rindo e até dançando, apesar da chuva fina, ao som do DJ Nepal. A fenda aberta por “Chronostasis” tinha sido fechada. Mas o tempo, apesar da distração geral, continua a ser relativo.

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