Entrevista com Carlos Casas

Para filmar a trilogia END, Carlos Casas levou dez anos, envolto em diversas dificuldades, desde o frio até a escassez de alimento. Em novembro, no dia 27, Carlos apresentou-se com o Chelpa Ferro no Instituto dos Arquitetos do Brasil  pela primeira vez esses três filmes como performance.

Joca Vidal, DJ e Jornalista do Rio de Janeiro, entrevistou o artista por email e conversou um pouco sobre esse processo difícil que envolveu uma década de esforço e determinação. Junto, algumas fotos tiradas por Diana Sandes e Rodrigo Torres.

Como foi seu processo de pesquisa e quanto tempo foi necessário para a escolha dos locais de filmagem?

Desde que tive a ideia de filmar, cada projeto levou um longo tempo de pesquisa. Patagônia entre 1999 e 2002, com dois períodos de filmagem; Aral entre 2002 e 2003, um período; e Siberia, entre 2005 e 2009, também com dois períodos de filmagem.

A mais longa e a mais difícil foi o projeto Siberia por causa das permissões e do difícil acesso. Fiquei em Moscou durante um mês fazendo reuniões e contato com as pessoas. Obter permissões para acessar Chukotka não é fácil, lá é um enclave militar russo e uma região autônoma, ou seja, muita burocracia.

Você teve financiamento de patrocinadores ou os filmes da trilogia foram investimento pessoal?

Todas as minhas obras são um investimento pessoal, a minha saúde, minha mente, meu tempo… Mas a trilogia foi produzida enquanto eu estava como artista residente e consultor criativo na Fabrica e na revista Colors. Tivemos também uma parceria com oum canal de TV Suiço-Italiano, mas todos os três disponibilizaram um orçamento muito pequeno

 

Houve contato prévio com os entrevistados?

Nós conhecemos a maioria dos nossos personagens no período antes das filmagens. Alguns deles, como no filme Patagonia, exigiam mais tempo e uma espécie de casting foi feito antes de fotografar. Todos eles foram resultado de uma pesquisa das necessidades e requisitos do casting, mas há sempre o fator surpresa que você encontra quando está em um local como esse.

Quais foram as precauções tomadas com o frio e comida? Usou roupas especiais? Como foram os preparativos para a Sibéria?

Sibéria e Patagônia foram extremamente frias, a temperatura na Sibéria estava pegando em -38 graus e o vento era muito forte e congelante. Roupas são uma parte muito importante para manter-se vivo, assim como comer bem e estar em forma.

A comida na maioria desses lugares é escassa, especialmente em Aral, onde eu era alimentado somente de pão e marmelada russa durante um mês. Na Sibéria eu comia principalmente carne de baleia, pele, gordura e carne de foca e morsa. Não há legumes e conservas são muito caras. Na Patagônia nós sobrevivemos apenas com uma dieta constituída de ovelhas e carne de vaca.

Qual foi o local que você enfrentou a temperatura mais baixa e tinha dificuldade para seguir as filmagens?

A Sibéria exigiu um cronograma disciplinar muito rigido para fotografar. E fotografar é um procedimento muito preciso já que a câmera não funciona com menos de 35 graus de frio. Então eu tive que trabalhar em estrados, cobrindo e mantendo a câmera perto do meu corpo. Criei uma espécie de saco especial com a pele de morsa que o caçador de baleias forneceu-me para manter meu equipamento durante a viagem.

Quais as pessoas retratadas na trilogia END que te surpreenderam? 

Eu aprendi muito com todos eles. Do Peter, na Patagônia, eu aprendi o significado de isolamento e auto abandono, tipo uma aposentadoria ou auto-reclusão; do Jumagul, em Aral, aprendi que as coisas têm o seu curso e nós não devemos ter pressa, estamos vivendo em um círculo completo; e do Edward, caçador de baleia, entendi o que isso significa, seu mais profundo significado, sua dimensão espiritual e humana.

Você conseguiria ser feliz vivendo em lugares tão inóspitos?

‘Feliz’ é uma palavra que distorce e corrompe, na realidade o que você sente nesses lugares é que você está vivo. A palavra ‘feliz’ de alguma forma é corrompida pelas modernas idéias materialistas. Você está vivo, você é parte de tudo, este é o sentimento nesses lugares.

Qual foi o momento mais memorável durante o contato com os baleeiros?

Foi caçar com eles, ouvindo, ficando em silêncio, olhando para o horizonte, tentando entender suas relações com as baleias. A sensação de medo é forte na frente da baleia. Comer com eles logo após a caça, fazer parte de um sacrifício como uma luta comum, estar no mesmo nível. Sobreviver…

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *