A captura do invisível dá o tom mágico da instalação “Incorporais”, da fotógrafa e artista visual Dani Dacorso, um dos destaques do Festival Multiplicidade 2019. Nela, registros de pessoas envoltas em tecidos brancos e maquiagem fosforescente – feitos durante uma residência artística em um hotel na zona portuária do Rio de Janeiro, em 2016 – evocam a dolorosa memória daquela região, antigo mercado de escravos na cidade. Projetadas em uma tela transparente, as imagens parecem voar e dançar, como fantasmas do passado, ao som do percussionista Leo Leobons.
– É como se eu estivesse registrando e a presença de seres invisíveis pelo seu contorno – conta Dani – E o tambor traz uma carga ancestral
Como surgiu “Incorporais”?
Dani Dacorso – O trabalho começou numa residência artística que fiz em um hotel na praça Mauá. A ideia inicial era fazer retratos no meu quarto. Resolvi usar luz negra, ou ultravioleta induzida, que faz com que os objetos e materiais que são brancos e fosforescentes brilhem, enquanto outros que não reagem a ela aparecem escuros. Me interessava usar os extremos opostos da escala tonal – preto e branco – para demarcar limites. Como se eu estivesse registrando a presença de seres invisíveis pelo seu contorno. Fantasmagorias, arquétipos, formas pensamento…
De que forma a percussão de Leo Leobons contribui para a instalação?
DD – Uma coisa que eu amo no Multiplicidade é a possibilidade de trabalhar com outros artistas num atravessamento de linguagens. Nesse sentido, a presença do Léo – cujo trabalho admiro há tempos – potencializa o trabalho, não só pelo aspecto cênico da presença dele no palco com o tambor, que dá à apresentação um caráter performático, mas também pela condução, um caminho que a música cria para as imagens. E o tambor traz uma carga ancestral, sem a gente precisar ficar explicando muito; definindo quem é o que.
Qual o significado de representar o invisível?
DD – Como diz Anne Cauquelin – tirei o nome do trabalho de um livro dela, chamado “Frequentar os incorporais” -, na arte contemporânea estamos sempre caçando o invisível, tentando dar forma ao que não tem. Sobre o invisível , podemos chamá-lo talvez de…inconsciente? Tem o que a gente chama de espiritual, mas também passa por coisas que a gente sente, por relações e também tem o invisível das pessoas fotografadas, que é desvelado no gesto. Nesse sentido, “Incorporais” é um trabalho colaborativo, feito de representações múltiplas.